segunda-feira, 29 de fevereiro de 2016

‘A salvação de Deus não segue os nossos esquemas’, disse o Papa em Santa Marta



O Papa Francisco, na homilia da missa celebrada esta manhã em Santa Marta, lembrou que a salvação de Deus não nos vem das coisas grandes, do poder ou do dinheiro, mas das coisas pequenas e simples.
Como disse o Papa, as leituras do dia nos falam da indignação: fica irritado um leproso, Naamã, o sírio, que pediu ao profeta Eliseu para curá-lo, mas não aprecia a forma simples em que esta cura simples deveria acontecer. Também ficam irritados os moradores de Nazaré com as palavras de Jesus, seu concidadão. É a indignação perante o projeto de salvação de Deus que não segue os nossos esquemas. Por isso, o Pontífice advertiu que não é “como nós pensamos que é a salvação, essa salvação que todos queremos”..
Jesus sente o “desprezo” dos “doutores da Lei que procuravam a salvação na casuística da moralidade” e em muitos preceitos, mas o povo não confiava neles. Assim, indicou que os saduceus procuravam a salvação nos compromissos com os poderes do mundo. E as pessoas não acreditavam neles. Mas sim acreditavam em Jesus, “porque falava com autoridade”.
E por que essa indignação? O Papa respondeu que é porque em nossa imaginação “a salvação deve vir de algo grande, algo majestoso; só nos salvam os poderosos, os que têm força, que têm dinheiro, que têm poder: estes podem salvar-nos”. Mas – recordou – o plano de Deus é outro. “Ficam irritados porque não podem entender que a salvação somente venha do pequeno, da simplicidade das coisas de Deus”.
A este respeito, Francisco continuou garantindo que, quando Jesus faz a proposta do caminho de salvação nunca fala de grandes coisas, mas de coisas pequenas. São “dois pilares do Evangelho” que são lidos em Mateus, as bem-aventuranças, e no capítulo 25, o juízo final.
Dessa forma, convidou, como preparação para a Páscoa, para se ler as bem-aventuranças e Mateus 25 e, assim, “pensar e ver se algo disso nos deixa irritados, tira a paz. Porque a indignação é um luxo que só podem permitir-se os vaidosos, os orgulhosos”.
Por fim, o Santo Padre recordou que nos fará bem tomar um pouco de tempo para ler as bem-aventuranças, ler Mateus 25 e estar atentos ao que acontece nos nossos corações: “Se surgir algo de indignação, pedir a graça do Senhor para compreender que o único caminho da salvação é a ‘loucura da Cruz’, ou seja, a aniquilação do Filho de Deus, do tornar-se pequeno. Representado aqui, no banho no Jordão ou no pequeno povo de Nazaré”.

“Nunca é tarde demais para converter-nos, mas é urgente fazê-lo”, disse o Papa no Angelus de ontem



Diante das crônicas, que diariamente relatam terríveis notícias de “homicídios”, “acidentes” e “catástrofes”, não devemos ceder a atitudes supersticiosas, vendo nessas coisas punições divinas e culpar os homens ou até mesmo Deus.
Em face de tais eventos, disse nesse domingo, 28, o Papa Francisco, por ocasião do Angelus, é necessário comportar-se como recomendado por Jesus.
No Evangelho de hoje (cf. Lc 13,1-5), o Senhor menciona “dois acontecimentos trágicos que, naquele tempo, tinham causado grande espanto: uma repressão cruenta realizada pelos soldados romanos dentro do templo; e a queda da torre de Siloé, em Jerusalém, que tinha causado dizoito vítimas”, recordou o Santo Padre.
Jesus é consciente da “mentalidade supersticiosa” de seus interlocutores e do “caminho errado” com o qual interpretavam esses eventos: eles pensam que “se aqueles homens foram mortos de forma tão cruel, é sinal de que Deus os castigou por alguma culpa grave que tinham cometido” e que, em certo sentido, “eles mereciam”, enquanto que quem tinha sido poupado poderia estar “tranquilo” na consciência.
De fato, explica Jesus, “Deus não permite as tragédias para punir as culpas”, também porque “aquelas pobres vítimas não eram piores do que outros”. O seu convite é de “tirar destes fatos dolorosos uma advertência que diz respeito a todos, porque todos somos pecadores”, tanto assim que, aos que lhe haviam perguntado, tinha dito: “Se não vos converterdes, perecereis todos do mesmo modo” ( v. 3).
Também a nós, contemporâneos, pode vir a tentação de “descarregar” a responsabilidade dos eventos trágicos ou catastróficos “sobre as vítimas, ou mesmo sobre o próprio Deus”. No entanto, o Evangelho nos levanta algumas questões: “que ideia de Deus nós nos fizemos? Estamos convencidos de que Deus seja assim, ou aquela não é, isso sim, uma projeção nossa, um deus feito ‘à nossa imagem e semelhança’?”.
Jesus nos chama a “mudar o coração, a fazer uma mudança radical no caminho da nossa vida, abandonando os pactos com o mal” e as “hipocrisias” para “definitivamente tomar o caminho do Evangelho”. Deus não gosta de “boas pessoas” ou de simples “fieis, até bastante praticantes”, que, por isso, “acreditam que são justificados”.
Muitos de nós são como “uma árvore que, durante anos, tem dado muitas provas de sua esterilidade”, como a “figueira estéril”, de que fala o Evangelho (cf .. V.9). No entanto, nisso, Jesus mostra uma “paciência sem limites” oferecendo-nos tempos de graça e arrependimento como a Quaresma ou o atual Ano Jubilar da Misericórdia.
“Vocês já pensaram na paciência de Deus? – perguntou o Papa aos fieis – . Pensaram também na sua preocupação inflexível com os pecadores, como deveriam provocar-nos à impaciência nas relações conosco mesmos. Nunca é tarde demais para converter-se, nunca! Até o último momento: a paciência de Deus que nos espera”.
Bergoglio, portanto, citou a anedota de Santa Teresa do Menino Jesus, quando começou a rezar por um condenado a morte, que até o último momento rejeitava o sacerdote para a confissão final. Enquanto Santa Teresa continuava a orar no seu convento, aquele homem, “bem no momento de ser morto, dirigiu-se ao sacerdote, tomou o crucifixo e o beijou”.
Um episódio que revela a “paciência de Deus”, que se manifesta com qualquer um de nós, que estamos sempre na iminência de cair em pecado e Ele “nos salva”, com “sua misericórdia”.
“Nunca é tarde demais para se converter, mas é urgente, é agora! Comecemos hoje”, recomendou o Pontífice, invocando Nossa Senhora, para que nos ajude a “abrir o coração à graça de Deus, à sua misericórdia” e a “não julgar jamais os demais, mas deixar-nos provocar pelas desgraças diárias para fazermos um sério exame de consciência e converter-nos”.

Um Ano Santo significa um ano de missão



O ano começa movido pelo ardor missionário para as famílias, jovens, criança e idosos do Movimento Apostólico de Schoenstatt. O mês de fevereiro é tempo de missão, de sair de si como parte de uma Igreja missionária, em saída. Três cidades – Londrina/PR, Balsa Nova/PR e Mairiporã/SP –, receberam neste mês os grupos que saem para compartilhar Cristo e Maria com o mundo, sendo um sinal da misericórdia do Pai.
Cerca de 250 pessoas participam em fevereiro das Missões de Schoenstatt. Missionários de várias idades foram às ruas para levar a mensagem do Evangelho e a alegria de pertencer ao Pai.
O Papa Francisco, afirma: “A Igreja é mãe. É a nossa ‘santa mãe Igreja’ que nos gera no Batismo, nos faz crescer em sua comunidade e tem atitudes de maternidade, de meiguice, de bondade. A Mãe Maria e a mãe Igreja sabem acariciar seus filhos, dão ternura. Pensar na Igreja sem esta maternidade é pensar numa associação rígida, sem calor humano, órfã” (15.9.2015). Acompanhados de uma imagem peregrina da Mãe e Rainha, Mãe e coração da Igreja, os missionários schoenstattianos entram nas casas que lhes abrem as portas, leem a Bíblia com a família, rezam juntos, conversam, se interessam pela realidade daquele lar. Eles são a presença da ternura da Igreja para cada família, acolhendo, com carinho e cuidado, suas realidades e colocando-as novamente em comunhão com a comunidade paroquial. Nas casas em que não são recebidos, os missionários rezam diante do portão, suplicando a bênção de Deus para esse lar.
Robson Popoatzki de Porto Amazonas/PR, cidade que recebeu os missionários de Schoenstatt em 2014 e 2015, empolgado pelo que vivenciou, neste ano de 2016, também decide ser um missionário e parte para a missão schoenstattiana, as Missões Familiares em Balsa Nova/PR: “Eu sabia que seria uma experiência muito mais intensa do que ser missionado. Quando descobri como realmente acontecem as Missões, me veio a vontade de novamente participar em 2017. Este ano tivemos dois missionários da minha cidade, mas para o ano que vem esperamos que novas pessoas também queiram participar. Como eu disse em minha comunidade, é uma experiência incrível e quem participa não se arrepende”.
Pe. Vandemir Meister, superior dos Padres de Schoenstatt no Brasil, motiva os missionários em Mairiporã: “Evangelização é dar testemunho de vida. Nesses dias os missionários estão evangelizando com o testemunho e com a Palavra de Deus. Quem participa das missões sai com ‘as baterias recarregadas de forças’, porque se aprende muito ao visitar cada família. Quem mais aprende é o próprio missionário”.

Obras de misericórdia no Ano Santo
Em Londrina/PR, levando a Mãe Peregrina com seu Filho às casas, os missionários tomam muito a serio as obras de misericórdia. No Jardim Marabá, eles reformam uma praça e um parque infantil. Isso abriu caminhos para o anúncio, pois, as pessoas da comunidade se aproximam tímidas ao ver os voluntários reformando sua praça e logo se sentem confiantes para conversar e se inteirar do projeto missionário.
“O Ano da Misericórdia faz-se também muito prático em uma missão, pois conseguimos realizar tanto as obras de misericórdia espirituais como as corporais. Visitando as casas encontramos muitas realidades que necessitam desse amor misericordioso do Pai”, dizem Anaísa e Mateus Carvalho, reitores das Missões em Londrina. Para Paulo Sergio Brilha Galrão, o católico tem necessidade de receber a visita de seu irmão na fé cristã: “O que me marcou foi esse acolhimento das pessoas, fomos acolher e acabamos sendo acolhidos, fomos ensinar e acabamos aprendendo muito mais e tudo isso devemos à graça de Nossa Senhora”.
Monique Vaz, de Mairiporã, trocou o descanso pela missão e não se arrepende: “Enxerguei como Deus é misericordioso. Vou guardar essa experiência, cada palavra, cada testemunho. Eu levei um pouco de Deus na minha própria cidade, a princípio fiquei assustada, porque conheço as pessoas, mas depois vi que as pessoas que conheço são as que mais precisam”.
O reitor das Missões em Mairiporã, Roberto Cardoso da Silva Bueno, conclui: “Sentimos a presença de Deus. Foi muito importante quando, ao entrarmos nas casas, víamos lágrimas nos olhos das pessoas, dizendo: ‘Nossa, vocês são católicos? Nunca vi católicos fazerem isso!’. A partir do momento em que conhecemos Jesus e sabemos que ele é nossa fonte de vida, nós queremos levá-lo às pessoas”.
[Texto de Karen Bueno/Ir. M. Nilza P. da Silva]

Padre Lombardi: “Há uma expectativa de salvação em todo o mundo”



“Há uma expectativa de salvação, uma necessidade de salvação em todo o mundo”, à qual os comunicadores que trabalham na Igreja também devem saber corresponder, disse o padre Federico Lombardi na homilia da missa de despedida do seu serviço como diretor da Rádio Vaticano, celebrada na manhã de hoje na igreja de Santa Maria em Traspontina.
Concelebraram mons. Dario Edoardo Viganò, prefeito da secretaria para a comunicação, e mons. Lucio Ruiz, membro da mesma secretaria.
Foram três as palavras-chave da reflexão de Lombardi: “Missão, conversão, comunhão”.
Partindo das leituras do dia, o jesuíta citou as figuras bíblicas de Naman, o sírio, e da viúva de Sarepta, respectivamente, como emblema daqueles que são “aparentemente ricos, mas espiritualmente pobres e necessitados”, e daqueles que são “pessoas realmente pobres, mas que se confiam a Deus completamente, não tendo outro apoio com o qual contar”.
“Existem inúmeras esperas de salvação”, hoje, no mundo, nessas duas categorias de pessoas e em muitíssimas outras, “que precisam de ajuda, de esperança no Senhor”, disse o porta-voz vaticano. Jesus, como recordou o padre, “veio para trazer a Palavra de Deus até os confins da terra, para todos aqueles que têm necessidade material ou espiritual de salvação, para levar aquela misericórdia de que tanto falamos neste ano, para encontrar a todos, onde quer que estejam”.
Lombardi finalizou convidando “a ampliar a visão a todas as esperas que existem no mundo todo e em todos os tempos, porque foi para isto que veio Jesus”.

Microcefalia e Zika Vírus: perplexidades, dúvidas, hipóteses e direitos



Nota do grupo de trabalho da União dos juristas católicos do Rio de Janeiro sobre a crise de microcefalia no Brasil

26 fevereiro 2016RedacaoNotícias do Mundo

The yellowfever mosquito Aedes aegypti. Wikipédia commons
 Publicamos abaixo a nota do grupo de trabalho da União dos juristas católicos do Rio de Janeiro sobre a crise de microcefalia no Brasil.
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MICROCEFALIA E ZIKA VÍRUS:
PERPLEXIDADES, DÚVIDAS, HIPÓTESES E DIREITOS

A atual crise na saúde pública brasileira, decorrente do aumento dos casos de microcefalia – e mais recentemente da Síndrome de Guillain-Barré – tem sido supostamente associada, em maior ou menor grau, a uma epidemia causada pelo Zika vírus. Este conturbado cenário soma-se a outras graves crises pelas quais passa a nossa nação. Correlacionado a isso, transparece o drama das pessoas e famílias atingidas, bem como direitos individuais e sociais, em especial os direitos constitucionais à saúde e à inviolabilidade do direito à vida, desde o início da existência no útero materno.

A partir de novembro de 2015, foi manifestada surpresa com o grande número de casos de microcefalia detectados no Sistema Único de Saúde, principalmente no Nordeste, levando à decretação de emergência nacional. No dia 1º de fevereiro de 2016, foi anunciado pela Organização Mundial de Saúde (OMS) emergência de saúde pública internacional, na qual foi afirmado que a investigação sobre a causa dos novos conglomerados de casos de microcefalia e transtornos neurológicos deve intensificar-se para determinar se há uma relação de causalidade com o vírus da Zika e outros fatores ou cofatores.

Em que pese um tentador estabelecimento da relação de causa e efeito entre o Zika vírus e a microcefalia, ainda não há o reconhecimento pela comunidade científica da referida associação, pelo não preenchimento de todos os critérios necessários que normalmente são exigidos para esta conclusão. De fato, há surtos de Zika em outros países em que não se observa maior prevalência de microcefalia, sendo milhares os exemplos de mulheres grávidas infectadas com o referido vírus, na Colômbia, Cabo Verde e El Salvador. No Brasil, a quase totalidade dos novos casos confirmados de microcefalia está localizada no Nordeste (cerca de 98%), principalmente em Pernambuco e Bahia, apesar de 22 estados apresentarem “circulação autóctone do vírus Zika”.

Como não foi cientificamente demonstrada a etiopatogenia da microcefalia a partir do vírus Zika, o aumento do número de casos confirmados de microcefalia e/ou alterações do sistema nervoso central pode ser, pelo menos em tese, devido a outros fatores que não o Zika vírus. Porém, tem sido passada, direta ou indiretamente, a ideia  de “relação” entre o vírus e a microcefalia, algumas vezes dando a impressão de que o assunto está, do ponto de vista científico, definitivamente estabelecido, constituindo, portanto, matéria inquestionável. Por sua vez, algumas locuções  governamentais, a despeito da absoluta escassez de publicações científicas em plataformas acadêmicas de reputação nacional e internacional, têm, recentemente, abandonado a prudência, assumindo um ideário implícito de relação causa e efeito – na realidade não comprovada – embora possa ser ressalvada a existência de alguns textos oficiais mais cautelosos quanto a esta afirmação.
A declaração de emergência internacional da Organização Mundial da Saúde – OMS/WHO – deixa expressa não haver comprovação de causa e efeito, bem como a necessidade de aprofundar a investigação das causas, não só em relação ao Zika vírus, mas também em relação a outros fatores e cofatores. É justamente neste sentido que outras possíveis etiologias devem ser verificadas. Neste escopo, pode ser destacada uma hipótese levantada pelo Dr. Plínio Bezerra dos Santos Filho, possuidor de expressivo currículo acadêmico, já apresentada ao Ministério Público Federal, através de um requerimento de sua autoria.

Segundo texto do Dr. Plínio Bezerra, haveria a possibilidade de uma relação entre a microcefalia e duas vacinas aplicadas no Nordeste, a partir de novembro/dezembro de 2014, para debelar um surto de sarampo (MMR) e realizar a prevenção da Difteria, Coqueluche e Tétano (DTPa – Difteria, Tétano e Pertussis, acelular) esta última, tão somente em mulheres grávidas a partir do terceiro trimestre de gravidez. Será apresentada, a título de exemplo, apenas a argumentação quanto à vacina MMR (vacina tríplice viral contra o sarampo, a rubéola e a caxumba) que contém o vírus vivo atenuado da rubéola.

Para proteger do sarampo, a vacina MMR  teria sido aplicada – não em mulheres grávidas, o que seria uma contra-indicação – mas em mulheres em idade fértil nos meses de novembro/dezembro de 2014, em Pernambuco; e até  abril de 2015, no Ceará.  Estados vizinhos, com receio de contágio, também teriam aplicado a vacina. Rio Grande do Norte, por exemplo, terminou a vacinação contra sarampo em dezembro de 2014. O problema é que artigos científicos recomendam que a vacina MMR (contra sarampo) não  seja aplicada em mulheres que queiram engravidar e, caso tal ocorra, que haja o espaçamento de período  (mínimo) de um mês  entre a aplicação  da vacina e o início da gravidez. Nos Estados Unidos da América – EUA, nas décadas de 1970/1980, já fora prescrito como sendo de três meses o intervalo mínimo recomendado entre vacinação e gravidez.

No Estado de Pernambuco, após a vacinação de sarampo, houve também um surto de Dengue, com pico em abril de 2015. De fato, o informe Epidemiológico  SE 01 a 34/2015, do Estado de Pernambuco refere o total de 7.497 casos, dos quais: 250 Ign/branco; 1 Dengue grave; 74, “Dengue Clássico”; 1274 , “Descartado”; 1887, “Dengue”; 4.008 “Inconclusivo “. As mulheres que engravidaram no Estado de Pernambuco após a vacinação de sarampo (em novembro/dezembro 2014) teriam tido, pois, um possível contato com o Zika vírus no posterior surto de Dengue (em meados do primeiro semestre de 2015).

De acordo com o Informe 12 do COES-MICROCEFALIAS (Centro de Operações de Emergência em Saúde Pública sobre Microcefalias, do Ministério da Saúde, sobre o “Monitoramento dos Casos de Microcefalia no Brasil”), relativo ao período de 31.01.2016 a 06.02.2016, o número acumulado de notificações de suspeita de microcefalia e/ou alterações do sistema nervoso central, relativas ao Estado de Pernambuco era de 1.501 casos. Desses, haviam sido analisados, por ocasião do Informe COES 12 (semana de 21 de janeiro a 6 de fevereiro de 2016),  305 casos suspeitos, sendo 167 casos confirmados e 138 descartados. Cruzando-se esses dados com os dos Informes COES 2 e 3 (Semanas Epidemiológicas de 22 a 28 de novembro de 2015 e de 29 de novembro a 5 de dezembro de 2015, respectivamente), verifica-se que as notificações de casos suspeitos referentes ao Estado de Pernambuco, ora em análise pelo Ministério da Saúde, tanto para confirmação ou não de microcefalia, como para concomitância de infecção de Zika vírus, são os referentes ao final do mês  de novembro/início  de dezembro de 2015. Do Informe COES 2 para o Informe COES 3, ou seja, no espaço de apenas uma semana, houve 556 novos casos de notificações de casos suspeitos só para o Estado de Pernambuco, que passou a acumular, em 5 de dezembro de 2015, 804 casos suspeitos notificados.

Faltam ser analisados, tomando-se por base os dados disponíveis até o Informe COES 12, cerca de 500 casos desse pico de notificações, que se correlacionariam, segundo a análise desenvolvida pelo Dr. Plínio Bezerra, com o período da vacinação  contra o sarampo  em 2014 em Pernambuco (novembro/dezembro de 2014). Desta forma, conforme análise do referido doutor, considerar-se-ia o período de novembro/dezembro de 2014, da vacinação, acrescentando-se ao mesmo o período de 3 meses de intervalo recomendados antes da gravidez, e o período de 9 meses da própria gestação. Essa soma levaria para os meses de novembro e de dezembro de 2015, onde ocorreu o pico das notificações naquele Estado.

Do Informe COES 11 para o Informe COES 12, foram analisados apenas 17 novos casos de Pernambuco,  dos quais 14 confirmados  (82,35% –  muito acima da média atual de casos confirmados  de Pernambuco: 54,75%) e 3 descartados (17,64% – muito abaixo da média atual de casos descartados de Pernambuco: 45,25%). No Informe COES 11, dos 17 casos de microcefalia /alterações do sistema nervoso central, com infecção  concomitante  de Zika  vírus, 12 eram de Pernambuco. No Informe COES 12, dos 41 casos de microcefalia/alterações do sistema nervoso central, com infecção  concomitante  de Zika  vírus, 33 eram do Estado de Pernambuco, ou seja, 80,48%. A serem mantidos (para os próximos cerca de 500 casos de Pernambuco) os percentuais elevadíssimos, verificados  no Informe 12, de casos confirmados de microcefalia e de concomitante infecção  de zika vírus advindos do Estado de Pernambuco, haveria  um enorme aumento do número  global e percentual de casos de microcefalia confirmados e de concomitante infecção  de Zika vírus.

Tal situação, caso seja apresentada desvinculada dos necessários esclarecimentos, poderia gerar possível pânico na população,  que, por sua vez, poderia supor se tratassem de casos novos, de agora, desses dias do final de fevereiro de 2015 ou do próximo mês de março (tudo a depender da velocidade de análise das notificações de casos suspeitos advindos de Pernambuco). Poderia ser transmitida a falsa impressão de que a epidemia de microcefalia se alastra.  Na realidade, tais casos, como dito, se refeririam  a números  e percentuais que dizem respeito a Pernambuco, e seriam provenientes  de período de tempo correspondente ao pico das notificações de casos suspeitos de microcefalia advindas de Pernambuco (final de novembro /início  de dezembro de 2015), após  o que caíram muito as notificações respectivas.

A hipótese levantada pelo Dr. Plínio Bezerra que, ao menos aparentemente, parece ser corroborada pelos dados disponíveis atualmente, deveria, a nosso ver, respeitados os princípios constitucionais da publicidade e da adequada fundamentação, ser objeto de análise e de investigação aprofundada, de forma consoante com a recomendação da Organização Mundial da Saúde, no sentido de investigação sobre a determinação da relação de causalidade, não só quanto ao Zika vírus, mas igualmente quanto a outros fatores e cofatores.

Considerando ainda que a etiologia da microcefalia seja múltipla, não  devem ser descartadas a priori outras possíveis  causas, várias das quais têm sido divulgadas pela mídia como hipóteses a serem examinadas. Ademais, há de se ter em conta, ainda, a subnotificação de casos de microcefalia previamente existentes no Brasil, inclusive por questões de padronização da mensuração do perímetro cefálico.

Inobstante as observações acima, deve ser ressaltado que todas as medidas que vêm sendo preconizadas e efetivadas pelo Poder Público Federal, Estadual e Municipal, em esforço conjunto com a sociedade civil organizada e população em geral, de combate ao mosquito vetor, Aedes Egypti – transmissor da Dengue, Chicungunya e Zika vírus, dentre outros – e sua proliferação, bem como de precaução e cautela, devem continuar a ser apoiadas, sem prejuízo de medidas adicionais, com vistas a um saneamento básico estrutural adequado e mais abrangente, que dificulte a existência de ambiência para esse mosquito e/ou outros vetores. Todas essas medidas concorreriam para a busca de efetivação de direitos constitucionais básicos do povo brasileiro.

Em contrapartida, tentar instrumentalizar a crise atual para propor a morte de crianças acometidas por microcefalia no ventre materno por meio do aborto, como já chegou a ser aventado em nosso meio, parece-nos, a par de cruel e desrespeitador para com as famílias atingidas, uma proposta de indisfarçável conteúdo eugênico: matar alguém acometido por alguma doença grave, ou possivelmente grave, antes de seu nascimento.

Diante da penúria de trabalhos científicos, o momento é, pois, de investigação e prudência, inclusive para o estabelecimento de novas propostas terapêuticas. Haveria lugar, por exemplo, para a imunização passiva, com imunoglobulinas, para proporcionar proteção aos fetos de mães acometidos por uma virose no primeiro trimestre da gravidez, que seja comprovadamente lesiva para o sistema imunológico do feto? Uma recente revisão de vários trabalhos pela prestigiosa Cochrane Library – uma instituição internacionalmente reconhecida e dedicada à metodologia científica – em relação à imunização passiva após exposição de grávidas ao vírus da rubéola, examinando, em particular, o efeito sobre o desenvolvimento da Síndrome da Rubéola Congênita, não conseguiu garantir a sua real eficácia, apesar de existir pelo menos um trabalho que mostrava benefício com esta medida terapêutica. Foram recomendados novos estudos com melhores metodologias. Ou seja, se mesmo em uma doença como a Rubéola, em que a relação com a microcefalia está comprovada, ainda existem dúvidas quanto a vários aspectos importantes, porque agora se deixaria de lado a boa ciência, abdicando-se das corretas metodologias, passando-se a eleger condutas intempestivas e desrespeitosas para com o ser humano em uma afecção da qual pouco se sabe?

A dignidade da criatura humana, indissociavelmente relacionada a todo indivíduo humano desde o início de sua existência, com a concepção, não pode ser seccionada em razão de fases da existência, ou do lugar em que se dá ou do grau de saúde. Cabe ao Estado prevenir os riscos de agravos à saúde, conforme diretriz constitucional básica (vide art. 196, da Constituição Federal) e quando estes, por qualquer motivo, venham a ocorrer, buscar os meios para minimizá-los e superá-los e não buscar subterfúgios para matar o ser humano doente, na ilusão perversa de que com isso se acaba com a doença ou com o problema decorrente. Entendemos que uma leitura isenta e não preconceituosa da Constituição Federal, sem tendências discriminadoras inadmissíveis, deixa claro que os direitos são para todos, inclusive para aqueles que já existem e que se encontram em desenvolvimento no seio materno, e não apenas para os já nascidos, já registrados ou já crescidos.

Grupo de trabalho da UJUCARJ sobre a crise de microcefalia no Brasil.

UNIÃO DOS JURISTAS CATÓLICOS DO RIO DE JANEIRO

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