FONTE: ZENIT
Dom Jorge Ortiga apela à
criatividade, não quer pastorais repetidas
“Só uma forma ideologizada e extraviada de
religião pode pensar fazer justiça em nome do Omnipotente, massacrando
deliberadamente pessoas indefesas, como aconteceu nos sanguinários ataques
terroristas dos meses passados na África, Europa e Médio Oriente”, destacou o
Papa Francisco na manhã desta segunda-feira (11), ao receber os membros do
corpo diplomático acreditado junto da Santa Sé para as felicitações de Ano
Novo.
Durante seu minucioso discurso, o Papa recordou
que "toda a experiência religiosa, vivida autenticamente, só pode promover
a paz". Aliás, ele assegurou que “o mistério da Encarnação mostra-nos o
verdadeiro rosto de Deus, para quem o poder não significa força e destruição,
mas amor; a justiça não significa vingança, mas misericórdia”. Nesta
perspectiva, Francisco destacou o Jubileu extraordinário da Misericórdia
inaugurado em Central Africano República, durante sua viagem apostólica à
África. A este respeito, o Santo Padre disse que a abertura da Porta Santa da
Catedral de Bangui foi como "um sinal de encorajamento para erguerem o
olhar, retomarem o caminho e reencontrarem as razões do diálogo.
Francisco explicou que a misericórdia tem sido o
"fio condutor" que guiou suas viagens apostólicas ao longo do ano
passado. Então, relembrou sua visita a Sarajevo, Bolívia, Equador e Paraguai,
Cuba e Estados Unidos.
Ele também fez referência à importância da
família "que é a primeira e mais importante escola de misericórdia, na
qual se aprende a descobrir o rosto amoroso de Deus e onde cresce e se
desenvolve a nossa humanidade”. Francisco chamou a atenção para “medo
generalizado à condição definitiva que a família supõe e, quem o paga, são
sobretudo os mais novos, muitas vezes frágeis e desorientados, e os idosos que
acabam por ser esquecidos e abandonados”.
E afirmou que "um espírito individualista é
terreno fértil para medrar aquele sentido de indiferença para com o próximo,
que leva a tratá-lo como mero objeto de comércio, que impele a ignorar a
humanidade dos outros e acaba por tornar as pessoas medrosas e cínicas”.
O Santo Padre refletiu sobre a grave emergência
imigração que estamos enfrentando. Assim, referiu-se a voz de “milhares de
pessoas que choram enquanto fogem de guerras horríveis, de perseguições e
violações dos direitos humanos, da instabilidade política ou social, que
frequentemente lhes tornam impossível a vida na própria pátria”. É triste
constatar, alertou Francisco, que muitas vezes estes migrantes não se enquadram
nos sistemas de proteção baseados nos acordos internacionais.
Francisco alertou sobre a gravidade de
“habituar-se a estas situações de pobreza e necessidade, aos dramas de tantas
pessoas, fazendo com que se tornem «normalidade»”.
Para o Santo Padre “é preciso um compromisso
comum que inverta decididamente a cultura do descarte e da violação da vida
humana, para que ninguém se sinta negligenciado ou esquecido nem sejam
sacrificadas mais vidas pela falta de recursos e sobretudo de vontade
política”.
Neste sentido, Francisco falou da arrogância dos
poderosos que, para fins egoístas ou por cálculos estratégicos e políticos,
“instrumentalizam os fracos, reduzindo-os a objetos para fins egoístas”,
referindo-se a quem prática o tráfico ou o contrabando de seres humanos. Assim,
ele reiterou o apelo “a deter o tráfico de pessoas, que mercantiliza os seres
humanos,
especialmente os mais fracos e indefesos”.
Refletindo sobre as causas da emigração, o Santo
Padre observou que “desde há muito tempo que se poderia ter enfrentado grande
parte das causas das migrações”. E hoje, antes que seja tarde demais, “muito se
pode fazer para impedir as tragédias e construir a paz”. Mas isto significaria
“pôr em discussão hábitos e práticas consolidadas”, a começar “pelas
problemáticas relacionadas com o comércio dos armamentos, até ao problema da
conservação de matérias-primas e energia, aos investimentos, às políticas de
financiamento e apoio ao desenvolvimento, até à grave chaga da corrupção".
Por isso, é necessário “estabelecer projetos de médio e longo prazo que
ultrapassem a resposta de emergência”, afirmou ele.
O Santo Padre dedicou uma especial reflexão à
Europa que ao longo do ano passado, viu-se afetada por um fluxo impressionante
de refugiados, despertando “muitas dúvidas sobre as reais possibilidades de
recepção e adaptação das pessoas, sobre a mudança do meio cultural e social dos
países de acolhimento, bem como a redefinição de alguns equilíbrios
geopolíticos regionais”. Esse fluxo migratório “parece minar as bases daquele
«espírito humanista» que a Europa ama e defende desde sempre”, destacou
Francisco. “Mas não se pode dar ao luxo de perder os valores e os princípios de
humanidade, de respeito pela dignidade de cada pessoa, de subsidiariedade e de
mútua solidariedade, mesmo que, em alguns momentos da história, possam
constituir um fardo difícil de levar”.
Assim, ele reiterou a sua convicção de que a
Europa, “ajudada pelo seu grande património cultural e religioso, possui os
instrumentos para defender a centralidade da pessoa humana e encontrar o justo
equilíbrio entre estes dois deveres: o dever moral de tutelar os direitos dos
seus cidadãos e o dever de garantir a assistência e o acolhimento dos
migrantes”.
O Santo Padre expressou sua gratidão por “todas
as iniciativas que foram tomadas para favorecer uma recepção digna das
pessoas”. Ele assegurou que “as migrações constituirão uma pedra angular do
futuro do mundo, mais do que o têm sido até agora, e que as respostas só
poderão ser fruto dum trabalho comum, que respeite a dignidade humana e os
direitos das pessoas”.
Como indicado pelo Papa em seu longo discurso,
para abordar a questão da migração “é importante que seja dada atenção as suas
implicações culturais, a começar pelas relacionadas com a pertença religiosa”.
A este respeito, observou que o "extremismo e o fundamentalismo encontram
terreno fértil não só numa instrumentalização da religião para fins de poder,
mas também no vazio de ideais e na perda de identidade – inclusive religiosa –
que contradistingue dramaticamente o chamado Ocidente”. Para ele, “o
acolhimento pode ser ocasião propícia para uma nova compreensão e abertura de
horizonte, tanto para quem é acolhido, que tem o dever de respeitar os valores,
as tradições e as leis da comunidade que o acolhe, como para esta última
chamada a valorizar aquilo que cada imigrante pode oferecer para benefício de
toda a comunidade”.
Ao final do discurso, Francisco destacou “os
acordos internacionais importantes, que permitem olhar com esperança para o
futuro”. Ele mencionou o acordo sobre o programa nuclear iraniano e o acordo
sobre o clima na Conferência de Paris. E demonstrou sua preocupação com as
recentes tensões que surgiram na região do Golfo Pérsico, bem como na
preocupante experimentação militar realizada na Península Coreana. Assim, ele
expressou o desejo de que “as contraposições dêem lugar à voz da paz e à boa
vontade de procurar acordos”.
Por fim, o Santo Padre afirmou que “o desafio
maior de todos que nos espera é o de vencer a indiferença para juntos
construirmos a paz, que permanece um bem a perseguir sem cessar”.
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